Mudança no auxílio-doença pode fragilizar relações de trabalho
Sob o argumento de proporcionar melhores condições aos trabalhadores, o Governo Federal propõe que o pagamento do auxílio-doença passe a ser efetuado pelas próprias empresas empregadoras. A justificativa é a demora do segurado em conseguir uma perícia médica para que o benefício seja concedido. Especialistas avaliam, no entanto, que a medida fragiliza o trabalhador, onera as empresas e que a estratégia não se configura como a melhor solução.
Na prática, a ideia é seguir o modelo do salário-maternidade: as empresas pagam o benefício e depois são compensadas na contribuição previdenciária. Conforme explica o coordenador estadual do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP), Paulo Bacelar, se a empresa deve, por exemplo, R$ 50 mil à Previdência naquele mês, será descontado desse valor a cifra do auxílio-doença, havendo, assim, a compensação.
“No caso do auxílio-doença, são pessoas que não sabem quanto tempo vão ficar afastadas. Para as empresas que têm poucos funcionários, que têm pouco a pagar de Previdência, terão de arcar com o valor do benefício para o segurado e ainda vai ter de contratar uma outra pessoa para substituir a que está afastada”, ressalta Bacelar.
Para ele, a medida irá causar um aumento das demissões. “A empresa não vai querer uma pessoa doente sabendo que vai ter que pagar o auxílio. É retirar do Estado o dever de acolher as pessoas na hora que elas mais precisam, porque ela contribui para a Previdência para ter uma resposta do Estado e ganhar um salário, enquanto ela está doente”, argumenta o coordenador estadual do IBDP.
Precarização
Para o professor do departamento de Administração da Universidade Federal do Ceará (UFC), David Barbosa de Oliveira, a transferência só funciona para empresas de porte maior, que tenham caixa robusto e uma boa organização tributária inerentes. “Isso desonera o Estado e joga o encargo para a empresa, tornando mais caro para ela manter seu empregado. Me parece que eles querem desonerar a folha de pagamento, mas é uma forma de precarizar o mercado de trabalho e fomenta o emprego barato, o que causa vários danos sociais”, alerta o professor.
Oliveira ainda destaca que um dos prováveis efeitos para o Governo com a mudança é que, com a compensação, sobraria dinheiro para as empresas realizarem novos investimentos. “Mas isso não aconteceu, por exemplo, em 2014 quando tentaram desonerar parte da folha. As empresas pegaram essa sobra e aplicaram em fundos de seguros, não investiram. Ou seja, não é um modelo eficiente”, afirma David Barbosa.
Economia
Segundo cálculos do governo, a medida irá gerar uma economia de R$ 7 bilhões nos gastos da União, o que deixaria uma folga no limite do teto de gastos. Apesar da previsão, o presidente da Comissão de Direito Previdenciário e Assistência Social da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Ceará, João Ítalo Pompeu, não consegue ver como essa redução de gastos irá acontecer. “O INSS vai continuar pagando, cobrindo o que será descontado da dívida das empresas com a Previdência. Acaba saindo dos cofres do INSS do mesmo jeito”, diz.
Ele reforça o argumento de que as pequenas empresas, principalmente, serão prejudicadas. “Imagine uma empresa com 3 ou 4 funcionários. A dívida com a Previdência dela é muito pequena. A compensação poderá demorar muitos meses para ser concluída. Em vez de desonerar, a medida poderá prejudicar. Se é um governo liberal, que quer fomentar o empreendedorismo, a proposta não condiz, porque não vai beneficiar empresa nenhuma”, dispara Pompeu.
O presidente da Comissão ainda aponta que, no caso dos moradores de Fortaleza, o processo para conseguir perícia médica demora cerca de uma semana, apenas. “Até o pagamento começar a ser realizado, o período é de cerca de 15 dias, intervalo que, segundo ele, não comprometeria a sobrevivência do segurado. “No caso do interior é que realmente pode haver a demora de 40 dias para a perícia que eles alegam”, admite.
Informações Diário do Nordeste
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